quinta-feira, 29 de maio de 2008

Fumaça Na Argentina & Suas Conseqüências Ambientais

Diversos acontecimentos significativos viram notícia. E aí que está o interessante pois a nós leitores, ouvintes e telespectadores as informações nos é dita de uma forma e conteúdo que passado e evento entra na boca do povo, porém nem tudo que é dito é realmente significativo.
Para me fazer entender trago um exemplo que vivenciei agora em meados de abril, em Buenos Aires, Argentina, onde os pastos das fazendas do Delta do Paraná foram queimados pelos próprios fazendeiros, economizando assim gastos com a terra. Esta prática hoje é proibida no Brasil. A fumaça produzida pelos fazendeiros percorreu centenas de kilometros, tanto para Buenos Aires, quanto às cidades vizinhas viveram dias cinzentos passando do Rio de la Plata até o Litoral. Foi de fato uma calamidade.
Algumas reportagens mostravam fotos de satélite com a fumaça vista de forma extraordinária. Outros artigos mostravam porteños sem condições respiratórias de voltar para casa, pedindo apoio em clínicas, hospitais e delegacias. Eu mesmo, que passei uns dias em Buenos Aires tive meus momentos de crise respiratória e voltei com dificuldades respiratórias ao Brasil.
Me lembro a Presidenta da República Argentina sobrevoando de helicóptero e o exército buscando apagar e descobrir novos focos destes incêndios e buscar os responsáveis. Poderíamos falar sobre a forma rudimentar de tratar os pastos, do pouco
Porém, desta notícia o mais significativo de toda esta história está em outro lugar.
Os incêndios dos pastos no Delta colocam em risco ambiental um sistema único do país, chamado como Delta do Paraná. Esta região conta com a maior quantidade de espécies vegetais e animais dos três Estados afetados: Santa Fé, Entre Rios e Buenos Aires. Lá existe um ecossistema vulnerável e de alto valor para a biodiversidade, e de atividades econômicas de grande importância. O Delta constitui uma planície complexa inundável que contem um mosaico de regiões de umidade. Com uma heterogeneidade elevada cria diversas paisagens, incluindo partes declaradas pela Unesco Reservas da Biosfera. Na região estima-se que tenha 700 espécies vegetais, 543 espécies de vertebrados e 172 classes de peixes e uma variedade de 260 espécies de aves. Dentre estas, a espécie que mais preocupa os técnicos ambientais é o cervo dos pântanos, que já está em risco de extinção, além de pouco conhecido, estes tipos de mamífero se transformam normalmente na população mais sensível a este tipo de impacto, como os incêndios. Queima-se o habitat desta e outras espécies, tanto o local de alimento quanto possibilidades de refúgio. Esta questão se repete para aves aquáticas migratória, como o cisne de pescoço negro, que a centenas de anos e dezenas de espécies. Diversas espécies vegetais que foram queimados são como refúgio para outros animais, necessitam destas para sua sobrevivência, é óbvio que voltarão a crescer porém até lá cria-se outro desequilíbrio dentro da biodiversidade.
A questão da falta de um ordenamento territorial bem definido é uma das causas deste dano ambiental. Esta região afetada pelas queimadas é a última zona de biodiversidade dos três Estados. E a verdade que o Estado Argentino não tem claro um plano, não há uma ordem específica e as conseqüências saltam à vista como no incêndio.
O entorno da região do Delta teve uma impressionante mudança de escala, existem mais de um milhão de vacas no Delta. Por causa da expansão agrícola, em especial a soja terminou, quase por completo a agricultura familiar.
A complexidade da região mostra diversas paisagens, como ilhas fluviais com florestas e pradarias. Lá existem amplas extensões de água, de origem natural e artificial que atuam como reservatórios de água e de alimento. Cumprem múltiplas funções ecológicas, são regiões de reserva e purificação de água, amenizam inundações, são verdadeiras reservas naturais de Carbono, centenas de peixes utilizam o local para cumprir parte de seu ciclo de reprodução, habitat de diversas espécies de aves e animais. A região do Delta do Paraná foi proposta para ser declarada como região “Ramsar”, que é uma categoria de proteção internacional que se somaria a da Unesco.
Voltando a questão inicial do que ouvimos, lemos nos noticiários, fica cada vez mais claro o quanto é difícil nos conectar com a realidade da realidade, com o que acontece, suas causas, conseqüências. Conversando com alguns porteños a maior preocupação deles ainda estava se o vento mudaria de direção ou não, assim eles não teriam fumaça sobre suas cabeças, porém o local queimado terá suas seqüelas. Este local, terra de ninguém (somente dos fazendeiros locais) é mais uma preciosidade que deve urgentemente ser preservada. E quanto mais consciência a população tiver a respeito desta situação pressionaria o governo a limitar e proteger melhor este local.